O modelo do estágio na formação inicial de professores no Brasil ainda é um ponto que merece amadurecimento. Desde a sua inserção no currículo até as parcerias com as escolas de Educação Básica e Redes de Ensino. A pergunta balizadora é: os recém-formados estão preparados para iniciar a carreira docente?
Formar professores no Brasil é indiscutivelmente um ponto nevrálgico. A oferta de cursos com qualidade duvidosa, que visam simplesmente o preenchimento de vagas para atingir metas financeiras, que têm currículos mal elaborados e avaliações incipientes, traz um prejuízo alto para a Nação. A legislação e a regulação dos cursos superiores de formação de professores precisam ser cada vez mais exigentes, tanto na elaboração de conteúdos que não deem brechas para a existência de cursos de má qualidade, quanto no acompanhamento dos resultados atingidos.
As últimas diretrizes para a formação de professores exigem o cumprimento mínimo de 400 horas de estágio para os alunos dos cursos de licenciatura. No caso do curso de Pedagogia, inclusive, amplia-se a carga horária exigida, já que as Diretrizes Curriculares Nacionais exigiam o cumprimento mínimo de 300h de estágio curricular. Decisão acertada de ampliar a carga horária de estágio. Contudo, pergunta-se: somente ter essa exigência tem propiciado resultados positivos e efetivos? Em pesquisa recente sobre a formação de professores no Brasil, coordenada por Fernando Abrucio e com apoio do Movimento Todos Pela Educação (TPE), é possível identificar que os entrevistados concordam que há a necessidade de se mudar o sistema de estágios nas licenciaturas. Esse resultado evidencia a fraqueza desse componente no currículo de formação de professores naquilo que deve ser um dos eixos norteadores: o conhecimento da atuação in loco durante o período de formação inicial.
Como explicar o fracasso dos estágios?
Podem ser citados inúmeros fatores. Nesta reflexão, ressalto um deles que é a falta de parceria entre escolas de educação básica e as instituições de ensino superior. São questões importantes nessa discussão: como efetivar essa parceria e promover que escolas de educação básica e IES possam se tornar verdadeiramente corresponsáveis pela formação inicial de professores? A premissa básica a ser considerada é que se esse ponto não fosse importante na formação por que o estágio curricular deveria ser exigido?
A proposta de estágios no Instituto Singularidades
Em nossa experiência, no Instituto Singularidades, a formação de professores possui algumas especificidades e os estágios realizados nas escolas têm função primordial nessa formação. No curso de Pedagogia temos clareza de algumas especificidades, como:
1) A relação entre teoria e prática não se dá numa relação em que primeiro se aprende a teoria e depois a aplica na prática. Forma-se o professor construindo o seu olhar, em uma perspectiva pré-profissional, desde o início do curso, preparando-o para entender e refletir sobre a realidade educacional in loco desde o ingresso. Até porque todos os futuros professores foram alunos em escolas de Educação Básica e ressignificar esse olhar para outra perspectiva, em que ele enxergue a escola como um futuro profissional, deve ser feita precocemente na formação.
2) A participação das escolas de Educação Básica e dos professores mais experientes é fundamental. Na nossa concepção, essa integração de papéis deve ocorrer com a clareza da importância de cada um, que entendemos do seguinte modo:
- a) À escola parceira cabe receber o licenciando e promover sua imersão em situações reais de ensino e aprendizagem.
- b) Ao licenciando cabe observar, interagir, refletir e propor alternativas, levando em consideração as demandas de situações educativas reais.
- c) Ao Singularidades cabe fornecer suporte à observação, à reflexão, à fundamentação, à ação compartilhada, promover o aprendizado do registro e tematizar a prática.
Curso de Pedagogia – Instituto Singularidades. Fonte: Arquivo institucional.
Na formação inicial, o estágio precisa propiciar o desenvolvimento de competências para que o futuro professor seja capaz de: investigar a realidade educacional numa perspectiva crítica, reflexiva e propositiva; integrar as dimensões teórica e prática do currículo (que não podem ser aplicadas e entendidas como dimensões que se opõem); e articular de forma interdisciplinar os conteúdos das diversas disciplinas.
Como avançar nas parcerias com as escolas de Educação Básica?
Para as parcerias, desenvolvemos algumas ações:
1) Respeitamos os condicionantes da realidade de cada uma das escolas;
2) Estabelecemos canais de comunicação, por meio de reuniões em nossa instituição, visitas de profissionais do Singularidades às instituições, e também convidando os profissionais das escolas que recebem nossos alunos para conhecerem o nosso projeto pedagógico e participar de aulas da graduação.
Além disso, qualquer outro meio que permita se discutir a importância do estágio nas escolas é trazido para refletirmos e tentarmos colocar em prática.
Nas reuniões que temos feito com escolas que se dispõem a participar, já promovemos, no curso de Pedagogia, mudanças nas supervisões do estágio curricular e nas pautas orientadoras dos estudantes, sempre com o objetivo de aproximar a formação na IES e a formação in loco.
As dificuldades não são poucas. Acontecem em diferentes níveis, desde a operacionalização, a disponibilidade de tempo e os custos financeiros, tanto para as IES quanto para as escolas de Educação Básica. Nem tudo funciona maravilhosamente, mas a escuta e a valorização dessa parceria são condições inegociáveis.
Boas práticas são possíveis e devem ser ampliadas
Temos exemplos de boas práticas em nossa instituição. No curso de Pedagogia do Singularidades, recentemente, em uma atividade interdisciplinar entre as disciplinas Gestão Curricular, Planejamento Escolar e Projeto Educativo e Educação Inclusiva, coordenadas pelas professoras Franciele Busico Lima e Angela Di Paolo Mota, foi estabelecida uma parceria com a Direção do Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos (CIEJA), localizado em Perus (São Paulo/SP). Primeiramente os alunos fizeram uma visita técnica à escola e, na conversa com a professora dos jovens e adultos dessa instituição, ela colocou as problemáticas e necessidades de sua atuação, além de ensinar os estudantes de Pedagogia sobre materiais adaptativos que funcionam em sala de aula. A partir de uma demanda trazida da realidade, os futuros professores elaboraram jogos e materiais para os alunos do CIEJA/Perus.
Veja, a seguir, o registro dessa experiência maravilhosa!
Singularidades no CIEJA/Perus
Em prol de uma formação inicial mais qualificada de professores e da valorização da própria profissão, em que o professor mais experiente pode ensinar o ingressante na carreira. Vamos pensar seriamente sobre isso?
Cristina Nogueira Barelli é Coordenadora do Curso de Pedagogia do Instituto Singularidades. Contato: [email protected]
Fonte: Blog do Estadão – https://goo.gl/Scm2fo